Em 1997, o psicólogo Albert Magro, pesquisador da Faculdade Estadual de Fairmont, Virgínia do Oeste, conseguiu esclarecer o mistério. Ele mostrou a 495 indivíduos ilustrações e retratos de pessoas com diversas características e formatos do rosto e corpo. Os participantes deviam indicar quais aspectos consideravam mais atraentes.
Foi constatado que as pessoas detestam coxas curtas, pernas curvadas, dentes caninos grandes (sobretudo os pontiagudos), gengivas proeminentes, mãos longas, dedos curvados, polegares e pescoço curtos e maxilares excessivamente projetados. Entre as características mais apreciadas estão: pernas longas, pescoço comprido, lábios rosados e carnudos, olhos grandes, ombros eretos, dentes regulares, dedos afunilados, pele lisa e sem pêlos, ventre plano, arco da sola do pé acentuado, isto é, as mesmas características da Barbie. O estudo foi publicado na revista Perceptual and Motor Skills. Faltava, porém, explicar por que esses aspectos são tão atraentes.
Albert Magro recorda que, ao longo da evolução da espécie, os traços hoje considerados atraentes desenvolveram-se quando as pessoas começaram a caminhar eretas, o que coincidiu com o aumento da inteligência, das habilidades manuais e com a dieta onívora. A adoção da marcha bípede, por exemplo, trouxe o alongamento das pernas e do pescoço e posicionou os ombros mais para trás. A alimentação variada modificou a forma do maxilar e da dentição. O desenvolvimento do córtex cerebral levou ao aumento do volume do crânio, ao passo que a inteligência ampliou a habilidade de usar utensílios, o que acarretou a modificação do formato das mãos. Quanto aos lábios, somos a única espécie cujas mucosas labiais são voltadas para fora, traço observado também em macacos, mas apenas no estágio fetal.
A evolução de Vênus
Magro constatou também que os aspectos que menos agradavam os participantes da pesquisa correspondiam às características de nossos antepassados mais primitivos e de alguns macacos modernos. Quando se olha para uma Barbie, nota-se que, não por acaso, a boneca é um condensado de traços evolutivos (corpo e rosto), sem nenhum traço primitivo. Seria este o segredo de sua popularidade?
Nossa percepção de beleza desenvolveu-se de forma simultânea à evolução de nossos traços físicos. De fato, se ?novas? características são mais freqüentes hoje, é porque os seres humanos escolheram companheiros dotados delas. E elas foram, portanto, conservadas na evolução graças a um método de reprodução de tipo ?seletivo?.
As fêmeas que possuem estas qualidades tinham maiores chances de se reproduzir e de gerar uma prole com suas próprias características; as outras simplesmente desapareciam. Podemos supor que os machos humanos se reproduziam (e talvez se reproduzam ainda) tendo uma Barbie como modelo inconsciente na escolha de sua parceira.
Apesar dos problemas que esta boneca pode suscitar por causa dos tipos de papéis femininos que encarna, ela ilustra o modo pelo qual se desenvolveu a percepção da beleza humana: Barbie tem todos os elementos físicos que julgamos ?bonitos?.
Alguns psicólogos evolucionistas acreditam que, enquanto os padrões para avaliar o rosto variam ligeiramente de acordo com a época e a cultura, para o corpo existiria uma norma universal de beleza. Segundo a hipótese darwiniana, de fato a beleza serviria para identificar os indivíduos com ?bons genes?. Seria um indicador de boa saúde, e nós preferimos pessoas bonitas para aumentar as chances de unir nossos genes aos delas. Se os cabelos forem bonitos, o corpo esbelto e musculoso, a pele, lisa e firme, o rosto, simétrico, significa que o patrimônio genético assegura boas possibilidades de sobrevivência e de reprodução; e de modo especial um bom sistema imunológico.
Quadris darwinianos
Apesar da cintura fina, as ancas da Barbie são amplas. Um psicólogo da Universidade do Texas demonstrou que os homens são sensíveis a uma relação cintura-quadril inferior a 0,7 (por exemplo, 60 cm de cintura e 90 cm de quadril), o que seria indício da capacidade da mulher de enfrentar o parto sem grandes dificuldades.
Além disso, a aparência da boneca é jovem, e a juventude representa também um critério de beleza, já que a idade é um indicador de fertilidade. Os olhos grandes são apreciados justamente porque sinalizam juventude. Segundo estudo realizado em 1996, apenas os adolescentes preferiam mulheres cinco anos mais velhas. Homens adultos têm optado, ao longo dos séculos, pelas mais novas. Finalmente, que dizer da cor dos cabelos da Barbie? Será verdade que os homens preferem as loiras?
Uma coisa é certa: gostamos das pessoas portadoras de genes distantes dos nossos porque a mistura genética aumenta a capacidade de sobrevivência. Por esta razão, em muitos países em que predominam os morenos, os loiros são mais procurados justamente por serem raros. Unir-se a eles permite manter a diversidade genética e reforçar o sistema imunológico da prole, fato que favoreceria a conservação da espécie.
Até os bebês são sensíveis à beleza. O psicólogo Alan Slater, da Universidade de Exeter, Reino Unido, mostrou para 100 meninos recém-nascidos entre as cinco horas e dois dias de vida, duas fotografias diferentes, colocadas uma ao lado da outra, ambas a cerca de 30 cm do rosto do bebê. Uma das fotos mostrava uma mulher muito bonita e a outra, uma mulher comum. O olhar dos bebês voltou-se quatro vezes mais para o rosto que os adultos julgariam atraente.
Isto demonstra que a identificação de feições ?agradáveis? parece ativa desde o nascimento. Segundo Slater, uma aparência bonita representaria de alguma forma o protótipo de um rosto humano; aliás, se fundíssemos centenas de rostos com a ajuda de computadores, obteríamos uma média estatística de características faciais particularmente atraentes. Na mente de um recém-nascido, os rostos bonitos representariam, portanto, um modelo que talvez pudesse servir de referência, permitindo a ele comparar este protótipo com os rostos que estão próximos.
Homens ou mulheres, independentemente de nossas características, somos todos sensíveis à beleza. Estamos ?biologicamente programados? para reconhecê-la e apreciá-la. E quem é que assume todas as características da beleza feminina? Ela mesma: a Barbie.
Tradução de Neury Carvalho Lima
Revista Mente e Cérebro