Educar para transformar
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Educar para transformar



Perfil - Paulo Freire


Com a ideia clara de que ler e aprender são condições essenciais para a cidadania autêntica e a transformação do mundo, o educador, professor de escola, pesquisador, político e inovador Paulo Freire dedicou a vida à educação e levou seu método educativo aos cinco continentes do planeta

Quando o jovem pernambucano, de Recife, entrou, aos 16 anos, no primeiro ano do ginásio - que começou tardiamente, por causa das dificuldades financeiras da família - não sabia que um dia lecionaria em Harvard, ou que colaboraria no desenvolvimento do programa nacional de alfabetização da Guiné Bissau. Paulo Reglus Neves Freire ficou muito conhecido pelo método que desenvolveu de educação para adultos, um sistema inovador e uma pedagogia revolucionária, que procurava alfabetizar utilizando elementos do cotidiano destes alunos.
Paulo Freire nasceu em 19 de setembro de 1921. O quintal da casa da Estrada do Encanamento, 724, no bairro Casa Amarela, no Recife, foi o espaço de sua alfabetização. À sombra das mangueiras, a senhora Edeltrudes, mãe de Paulo Freire, ensinou-o as primeiras palavras, que permitiriam ao menino ler o mundo à sua volta. Aos dez anos mudou-se com a família para Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana de Recife. Nos campos de futebol da cidade, ele conviveu com a camada mais pobre da cidade, jogando peladas com meninos camponeses e filhos de operários que moravam em morros e brincavam em córregos. Com o convívio, Paulo Freire descobriu uma forma diferente de pensar e de se expressar: a linguagem popular, que ele sempre privilegiou, e usou mais tarde em suas teorias como educador.
Depois do início tardio do primeiro ano de ginásio, Paulo Freire entrou, aos 22 anos, na Faculdade de Direito do Recife. Naquela época, o curso de direito era a única alternativa na área de ciências humanas. Nesse período, conheceu a professora primária Elza Maia Costa Oliveira, alfabetizadora, cinco anos mais velha do que ele, com quem se casou em 1944, e teve cinco filhos.
Paulo Freire iniciou a vida profissional no mesmo colégio que o acolheu como bolsista na adolescência, ao ser contratado como professor de língua portuguesa. Em 1947, assumiu o cargo de Diretor do Setor de Educação do Sesi (Serviço Social da Indústria) do Recife, em que conviveu com a questão da educação de adultos trabalhadores e percebeu a necessidade de centralizar esforços na alfabetização destes operários. Durante mais de 15 anos, entre as décadas de 1950 e 1960, Paulo Freire dedicou-se às experiências no campo da educação de adultos em áreas proletárias e subproletárias, urbanas e rurais, em Pernambuco. Seu método de alfabetização nasceu dentro do MCP - Movimento de Cultura Popular do Recife - a partir dos Círculos de Cultura, onde os participantes definiam as temáticas junto com os educadores.
A partir dessa experiência, Freire desenvolve uma de suas principais teorias: a de que a educação tem papel imprescindível no processo de conscientização e nos movimentos de massas. Ele a considerava desafiadora e transformadora, e defendia que para alcançála são essenciais o diálogo crítico, a fala e a convivência. Na sua concepção, a educação é um momento do processo de humanização, um ato político, de conhecimento e de criação.
Paulo Freire viveu intensamente o ambiente histórico-político efervescente, que vai da Revolução de 1930 e o golpe militar de 1964. Convidado por Paulo de Tarso, então ministro da educação do Governo João Goulart, o educador assumiu o cargo de coordenador do recém-criado Programa Nacional de Alfabetização, a partir do qual, utilizando seu método, pretendia alfabetizar cinco milhões de adultos em mais de 20 mil círculos de cultura. Criado em janeiro de 1964, o Programa foi extinto pela Ditadura Militar, logo depois do golpe.
Depois de ser preso por duas vezes, Freire, com 43 anos, exilou-se na Bolívia, antes do fim de 1964. A trajetória no exílio permitiu que o educador levasse suas ideias para os cinco continentes do mundo. Saiu da América do Sul em 1969, quando foi convidado para lecionar na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, onde ficou por dez meses e deu forma definitiva ao livro Ação Cultural para a Liberdade. Nesse período, escreve também dois de seus livros mais conhecidos: Educação Como Prática da Liberdade e Pedagogia do Oprimido.
Em seguida, foi transferido para Genebra, na Suíça, onde assumiu o cargo de consultor do Conselho Mundial das Igrejas. Ao lado de outros brasileiros exilados, fundou o Instituto de Ação Cultural (IDAC), cujo objetivo era prestar serviços educativos, especialmente aos países do Terceiro Mundo que lutavam por sua independência. Em 1975, Freire e a equipe do IDAC receberam o convite para colaborarem no desenvolvimento do programa nacional de alfabetização da Guiné-Bissau.
Entre 1975 e 1980, Freire trabalhou também em São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Angola, ajudando os governos e seus povos a construírem suas nações recém-libertadas do domínio português, através de um trabalho de educação popular. Nesse período, Paulo Freire levou seus conhecimentos a países dos cinco continentes, mas de modo especial à Austrália, Itália, Nicarágua, Ilhas Fiji, Índia, Tanzânia e aos países de colonização portuguesa.
Em junho de 1980, aos 57 anos, Paulo Freire desembarca no aeroporto de Viracopos em Campinas, regressando definitivamente ao país que havia deixado em 64, sob o comando dos militares. Na gestão da prefeita Luiza Erundina, Paulo Freire assume o cargo de Secretário de Educação da cidade de São Paulo, em janeiro de 1989, e promove reforma nas escolas, reestruturação dos colegiados, reformulação do currículo escolar, capacitação dos professores e formação de pessoal administrativo e técnico.
Em parceria com os movimentos populares, Paulo Freire criou o Mova-SP (Movimento de Alfabetização da Cidade de São Paulo), destinado a jovens e adultos. Era a fórmula para fortalecer os movimentos sociais populares e estabelecer novas alianças entre sociedade civil e Estado. Antes de morrer, em dois de maio de 1997, aos 75 anos de idade, Freire tornou-se um dos membros do Júri Internacional da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Apesar de todo reconhecimento internacional e a importância de sua pesquisa para a educação, Paulo Freire afirma: "Eu acho que uma das coisas melhores que eu fiz na minha vida, melhor do que os livros que eu escrevi, foi não deixar morrer em mim o menino que eu não pude ser e o menino que eu fui."
http://www.ipea.gov.br



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